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Quando o Inconsciente Fala em Sonhos, mas É Calado pela Interpretação Espiritualista

  • pastorsantinel
  • 13 de mai.
  • 2 min de leitura

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Sonhamos com lugares que nunca estivemos, com pessoas que já se foram, com situações absurdas, com medos antigos, com desejos que não ousamos confessar nem a nós mesmos. E ao acordar, perguntamo-nos: “O que esse sonho quis me dizer?”


Na tradição psicanalítica, especialmente em Freud, o sonho é a via régia para o inconsciente — uma linguagem simbólica que emerge quando o eu racional adormece. Nos sonhos, nossos desejos recalcados e nossas dores reprimidasencontram uma forma de expressão disfarçada. É o inconsciente tentando dizer: “Eu ainda estou aqui. Escute-me.”


Mas, em muitos contextos religiosos ou espiritualistas, os sonhos são rapidamente tomados como revelações externas, mensagens divinas, avisos espirituais, ataques do inimigo ou profecias. E assim, ao invés de serem interpretados como manifestações internas, tornam-se instrumentos de medo ou culpa. O sujeito é afastado de si — e da possibilidade de simbolizar sua própria experiência.


Um exemplo: uma mulher que sonha com um homem desconhecido e sente desejo — mas ao acordar, ao invés de se perguntar o que aquele desejo representa internamente (uma carência, um desejo por liberdade, ou a lembrança de algo perdido), ela ouve de alguém: “Foi um ataque espiritual.” E assim, o desejo é rapidamente silenciado pela moral. O inconsciente bate à porta, mas a religião (mal compreendida) fecha a tranca.


Outro caso: um sonho com uma casa desabando pode representar, simbolicamente, a instabilidade emocional ou familiar do sonhador. Mas em certos ambientes, isso pode ser lido apenas como “uma maldição” ou “uma brecha espiritual”. Perde-se, assim, a oportunidade de elaborar a dor. Substitui-se o simbólico pelo mágico.


A psicanálise não nega o valor da espiritualidade — mas alerta contra o uso dela como defesa contra o inconsciente. Quando se espiritualiza tudo, reprime-se ainda mais aquilo que precisa ser ouvido. E o que não é simbolizado, retorna como sintoma: ansiedade, culpa, confusão, angústia sem nome.


Sonhar é uma forma do sujeito falar com ele mesmo, mesmo que através de enigmas. Interpretar esse enigma exige escuta, não julgamento. O sonho não é, necessariamente, uma profecia ou um ataque. Muitas vezes, ele é um grito interno por reconhecimento, um teatro noturno onde o que foi calado durante o dia tenta ganhar palco.


O desafio é: vamos continuar dando ao sonho a função de nos afastar de nós mesmos? Ou vamos aprender a escutá-lo como parte de nossa travessia interna?


Porque, no fim, o sonho não vem para condenar.

Ele vem para revelar — o que fomos obrigados a esquecer.

 
 
 

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